domingo, 7 de fevereiro de 2016

Ruim mais vai, os difícieis caminhos de ferro do sertão mineiro

A primeira Estação Ferroviária de Caxambu
Em outros tempos as máquinas de ferro
Cruzavam seus chifres e queimavam os cascos
Na agulha grossa dos dormentes. 
As caldeiras ferviam nas locomotivas
E o vapor tecia sonhos de guerra
No peito dos soldados.
As cidades ferroviárias estavam no apogeu.
Levavam bois nas classes noturnas,
Esparramavam óleo no joelho dos vagões,
E faziam o ofício de mulheres-cortesãs ,
Fiando suéteres para a História Industrial.
Havia cabelos esvoaçantes, náuseas,
E na dobra do morro o olhar da lua
Comia a cauda agitadas dos trens.
Havia o pasmo das crianças e moças 
Perante a violência  das invenções inglesas
Nas gargantas úmidas de Minas.
Hoje, o silêncio   desceu sobre os trilhos
 E todos foram escondidos num casaco de capim*.

E lá vamos nós de trem pelos caminhos de ferro das Minas Gerais. Aqui num texto para lá de interessante escrito pelo do historiador e arqueólogo Paulo Paranhos, contando a história dos primórdios das estradas de ferro que cortaram um dia a nossa Minas Gerais. Vocês estão convidados a ler. Tomem os seus lugares, de preferencia à janela, mesmo aqueles que não compraram o bilhete da passagem, hoje é de graça. Boa viagem!

Os difíceis caminhos de ferro do sertão mineiro, por Paulo Paranhos

Desde o descobrimento das Águas Virtuosas de Caxambu, em 1814, até o final da década de 1880, o viajante que ali pretendia chegar tinha apenas uma opção: a estrada de terra, que trazia um grande desconforto, considerando não só a estreiteza do seu traçado bem como a dificuldade de se transportar em épocas de chuvas; para tanto, deveria ir de trem até o atual distrito de Engenheiro Passos (antiga estação de Boa Vista), ainda na província do Rio de Janeiro, e ali alugar cavalos ou uma carroça para subir a serra da Mantiqueira que, diga-se de passagem, no seu ponto mais elevado, alcança a altitude de 1.660m, na divisa do Rio de Janeiro com Minas Gerais.
O coronel Fulgêncio de Castro (1), em 1873, deu-nos um panorama do que se descortinava àquele que pretendia encetar a viagem:


Partindo da estação central da Estrada de Ferro de D. Pedro II no trem das 6 horas da manhã, o viajante chega à da Boa Vista (outrora Major Corrêa) a 1 hora e 50 minutos da tarde. No hotel da Boa Vista dá-se-lhe refeição, custando o almoço 1$500 e o jantar 2$000 e importando para os criados ou fâmulos o 1° em 1$000 e o 2° em 1$5000. Quem pernoitar nessa hospedaria paga mais 1$000. O viajante ao chegar a Boa Vista, se dispuser sem demora da precisa condução, pode ir pernoitar no “Palmital” a 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros) despendendo 1$000 por pessoa, 500 réis por criado e 1$000 pela cama. Os animais têm pasto gratuito. Deixando este hotel às 5 horas da manhã pode o viajante ir almoçar no “Engenho da Serra” a 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros). Neste hotel, onde a cozinha é excelente, os preços são iguais aos do precedente, e há as mesmas acomodações para os viajantes e seus animais. Nesta parte da Serra do Picu o frio é intenso e até certo ponto incômodo quando cai. Continuando a viagem, depois do conveniente repouso, e passando pelo arraial de S. José do Picu (2), onde há três pequenos hotéis, o principal dos quais é o Midões, e pelo de Capivari, pode o viajante pernoitar no hotel Rendez-vous des Voyageurs a 1⁄2 légua (3 quilômetros e 300 metros) de Capivari, ou a 4 léguas (26 quilômetros e 400 metros) do Engenho da Serra. Saindo deste lugar às 5 horas da manhã subsequente, e passando pelo importante arraial de Pouso Alto, onde há um bom hotel, e pela povoação do Sengó, o viajante almoçará no pequeno mas bem asseado e bem servido hotel do Alto da Boa Vista a 3 1/4 léguas (21 quilômetros e 450 metros) do ponto de partida, e continuando na jornada 1 hora depois do almoço, chegará a Caxambu, com 2 3⁄4 léguas (18 quilômetros e 150 metros) de caminho, às 4 ou às 5 horas da tarde. 


O coronel Fulgêncio de Castro, após fazer o traçado da viagem pela estrada de terra então existente, também mostra os seus conhecimentos geográficos, anotando para o viajante o que se lhe apresentaria em termos de topografia e faz um interessante comentário sobre a administração daquele caminho para as águas minerais do sul de Minas, senão vejamos:

"A estrada desde a Boa Vista até o alto do Picu, não obstante a extensa e íngreme subida da Serra, presta fácil trânsito, graças ao cuidado de sua conservação pela administração provincial do Rio de Janeiro. Mas do Registro do Picu em diante não estará muito longe da verdade quem afirmar que a cada passo nessa descida abrupta e de cerca de 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros) encontra o viajante verdadeiros precipícios na estação das chuvas. Segundo informações de pessoas fidedignas e até empregados fiscais da província de Minas Gerais, desde 1866 não tem esta estrada recebido o mais insignificante reparo, embora transitem por ali diariamente dezenas de viajantes e muitas cen- tenas de animais de toda a espécie. O completo abandono desta estrada utilíssima não pode, de certo, ser atribuído à deficiência de fundos nos cofres provinciais de Minas, porquanto consta de documentos oficiais que no quinquênio decorrido de 1° de julho de 1867 a 30 de junho de 1872 e nos três primeiros meses (julho a setembro) do exercício de 1872 a 1873 a importância das taxas arrecadadoras na Recebedoria do Picu (3) atingiu a importância de 624.019$729, sendo muito superior a 100:000$000, a média de cada um dos mencionados anos. Desde a povoação denominada João Pinto na raiz da Serra do Picu (território mineiro) a estrada geral, quase plana, atravessando apenas alguns morros de pequena elevação, oferece fácil, cômodo e até agradável trânsito na es- tação seca, mas na época das chuvas a falta quase total de pontes e pontilhões sobre numerosos ribeirões e córregos que atravessam, torna o trânsito muito difícil senão perigoso.” 

A partir da década de 1880, a estrada de ferro seria uma alternativa mais viável, econômica e, por incrível que pareça, dada a precariedade das composições, mais confortável para os viajantes que demandavam às estâncias hidrominerais do sul das Minas Gerais. 

Os primórdios da estrada de ferro 


Estrada de Ferro D. Pedro II, Linha Central, Estação Barra do Pirahy
A Estrada de Ferro D. Pedro II (4) que ia do Rio de Janeiro até Cruzeiro seria uma nova alternativa para os viajantes que pretendiam beneficiar-se das propriedades curativas das águas minerais de Caxambu. Nesta última estação, faziam baldeação com a Estrada de Ferro Minas & Rio, que chegara ao povoado de Soledade de Minas em 14 de junho de 1884. 

Sem dúvida, o trem em Caxambu seria um grande acontecimento, pois, antes desse evento, mesmo estando a estação de Soledade relativamente próxima ao povoado das Águas Virtuosas, as pessoas tinham que percorrer um longo caminho, em cavalos ou carroças que faziam a partir daquela estação, seguindo por uma estrada ruim que, quando chovia, praticamente impossibilitava o trânsito ou atrasava em muitas horas a sua chegada. 

O Dr. Henrique Monat, médico que para ali se deslocara com a finalidade de estudar as propriedades das águas minerais, anotou em sua obra intitulada Caxambu que quando as pessoas chegavam eram ridicularizadas pelos habitantes do povoado, pois, pela distância que percorriam e pela péssima estrada, vinham cobertas de poeira, suando muito e o apelido de “urso” foi muito popular na época. 

Voltemos um pouco atrás, quando tudo começou, no ano de 1881, mais precisamente no dia 25 de outubro, ocasião em que a Lei provincial no 2.844 autorizava o governo de Minas Gerais a contratar com a Companhia Estrada de Ferro do Rio Verde (5) a abertura de um ramal para as águas de Caxambu, com privilégio de cinquenta anos e subvenção quilométrica de nove contos de réis ou a garantia de juros de 7%, sobre o capital que fosse efetivamente empregado, não excedendo a mil contos o máximo, passando, ao final do prazo, ao domínio da província a estrada e seus acessórios. (6) 

Alguns estudos foram realizados e logo depois, em 1883, uma lei do governo de Minas Gerais determinou que o entroncamento da estrada de ferro de Caxambu fosse nas imediações da ponte de Soledade, e que a garantia de juros a ela concedida não se tornaria efetiva caso não fosse dado cumprimento a essa lei. (7) Mas tudo isso só estava no papel, não sendo realizadas as obras, mesmo porque o trem também não havia chegado ao povoado de Soledade, o que só aconteceu no ano seguinte, quando foi inaugurado o ramal da E.F. Minas & Rio, chegando até ali.

Estação de Soledade de Minas
O ano seguinte foi importante para Caxambu, porque surgiram dois decisivos personagens para a vinda do trem: o médico Antonino Polycarpo de Meirelles Enout, e o engenheiro Paulo Ferreira Alves. O Dr. Enout já clinicava em Caxambu e morava próximo a Baependi numa grande propriedade rural onde, dentre outras lavouras, dedicava-se ao cultivo de uvas. Para ele, a estrada de ferro seria importante para transportar a sua produção com mais rapidez e segurança. Já o Dr. Paulo Alves, depois de formado, exerceu a função de engenheiro civil na Estrada de Ferro Minas & Rio, rede ferroviária esta que seria posteriormente incorporada à D. Pedro II.

Foi exatamente quando estava no exercício dessa função que seria contratado pelo governo provincial de Minas Gerais para, juntamente com o Dr. Enout, dar início à construção de um “tramway” de bitola de sessenta centímetros, que partindo do ponto mais conveniente da Estrada de Ferro Minas & Rio, passando pelas águas de Caxambu, terminasse na cidade de Baependi. (8) Esse privilégio seria concedido por 40 anos; ao final desse prazo o “tramway’ (um trenzinho que servia para o transporte de cargas e, nos domingos e feriados, a ele era atrelado um carro de passeio) com o todo o seu material fixo e rodante passaria a ser propriedade da província. Também na mesma lei estipulava-se que os referidos contratados estariam isentos do pagamento de direitos para todo material que importassem na província, para a construção e o tráfego do “tramway”, e autorizados a fazerem desapropriações de terrenos e benfeitorias que fossem necessárias à construção da linha férrea. (9)

O Dr. Paulo Alves possuía grande experiência no ramo ferroviário, pois no ano de 1888 ele fora contemplado com um contrato com o governo provincial do Rio de Janeiro para a construção de uma ferrovia que ligasse Angra dos Reis à Grota Grande, na divisa com São Paulo, empreitada que não se concluiria, haja vista as implicações políticas que passaram a existir com a proclamação da Re- pública no Brasil.

Estação de Baependi
Obstáculos, no entanto, também se opuseram à chegada do trem a Caxambu: em Ouro Preto, na época capital da província de Minas Gerais, conseguiram ajustar a concessão; porém, um impasse surgiria no Rio de Janeiro, pois ali o conselheiro Luiz Matheus Maylask (10) já havia obtido concessão do governo imperial para rasgar um via férrea que, partindo do Rio de Janeiro, subiria a Serra da Mantiqueira, atravessaria Bom Jardim de Minas, passaria por Aiuruoca, Baependi, Caxambu, Soledade, Silvestre Ferraz (atual Carmo de Minas), Cristina, Itajubá, Ouro Fino e Eleutério, encontrando a Estrada de Ferro Mogiana, já no estado de São Paulo.

De que forma, então, resolveu-se a questão? Com o conselheiro Maylask abrindo mão do contrato em troca do pagamento de 200 mil réis em títulos da Estrada de Ferro Sapucaí (assim denominada a nova empreitada) e que, finalmente, sairia do papel.

Além da significativa contribuição que deram para Caxambu em termos de ligação ferroviária, também por influência do Dr. Enout, a recém implantada câmara municipal contrataria, em caráter provisório, o Dr. Paulo Alves para a organização de uma empresa, à parte daquela já existente, para a instalação de outro balneário no Parque das Águas, introduzindo neste e no primeiro alguns melhoramentos. Infelizmente foram em vão os esforços, considerando que o Dr. Paulo Alves fora convidado para exercer o cargo de prefeito de Niterói (o primeiro no cargo) e também porque a Empresa das Águas Minerais de Caxambu seria encampada pelo governo de Minas Gerais em 18 de abril de 1904, quando se encerrou o contrato do conselheiro Mayrink naquela estância.(11)

Foi, portanto, exatamente no dia 15 de março de 1891 que o trem chegou pela primeira vez em Caxambu, pelos trilhos da Viação Férrea Sapucaí. A primeira estação ferroviária foi construída nesse mesmo ano e demolida em 1948. Posteriormente, fizeram uma nova e depois a que hoje ali se encontra. Mas, infelizmente, o trem parou de correr em Caxambu aí por volta de 1972. 


Entendendo a malha ferroviária do sul de Minas Gerais 


Dona de uma das maiores extensões ferroviárias do Brasil, a Rede Mineira de Viação foi aquela que agregou, em sua formação, praticamente todas as demais ferrovias do sul das Minas Gerais. Dentre elas a Companhia Estrada de Ferro Oeste de Minas, que foi a primeira a ser organizada, em 2 de fevereiro de 1878, sendo oficialmente inaugurada em 28 de agosto de 1881, entre Sítio (hoje Antônio Carlos), Tiradentes e São João Del Rey. 


Oeste de Minas 

A Minas & Rio em Cruzeiro

A par de correrem os trilhos da Oeste pelo centro-norte de Minas, havia planos de descer até Barra Mansa, na linha da Central do Brasil e atingir o mar através de Angra dos Reis. Partindo de Lavras (1895), atingiu Paulo Freitas em 1898; Traituba, em 1903; São Vicente, em 1912; Turvo (hoje Andrelândia), em 1914; e ainda nesse mesmo ano chegava em Arantes (hoje Arantina). A ideia era atingir Bom Jardim de Minas na linha da Sapucaí e, cruzando-a, atingir Barra Mansa

A Oeste, que tinha interesse também no entroncamento com a Sapucaí, estendeu o ramal de Turvo a Livramento (hoje Liberdade) na linha da Sapucaí, de curta duração, pois por Bom Jardim de Minas também se alcançava a Sapucaí. Resolvidos os grandes problemas topográficos da serra da Mantiqueira, a descida por Bom Jardim ficou sendo apenas um ramal e, partindo de Arantes pela direita, a linha desceu cruzando a Sapucaí, em Rutilo, e se encontrava com os trilhos que vinham de Barra Mansa. A ligação só foi efetivada em 25 de maio de 1915.


Locomotiva da Oeste de Minas
Antes de ser constituída a Rede Mineira de Viação – RMV, que encamparia a Oeste, esta passou por várias administrações, tendo sido, inclusive, administrada por um banco alemão durante um bom período. Passou ao domínio do governo federal em 1903, devido a falências e dívidas. Mas o ponto histórico importante da Oeste de Minas é que, entre as ferrovias que constituíram a RMV (Rede Mineira de Viação), ela foi a mais antiga. 

Muitos traçados e ramais ainda foram projetados na Oeste e não foram concluídos, ora por falta de recursos financeiros, ora por estudos mostrando outros traçados melhores.



Rede Sul-Mineira


A Muzambinho


Em sua constituição, a Rede Sul-Mineira arregimentou a Sapucaí, a Muzambinho e a Minas & Rio. Nas linhas da Muzambinho foi construído o ramal de Três Pontas. Aí surgiu a E. F. Trespontana como uma ferrovia particular com 20 km de extensão, com o km zero na Estação de Espera (da E. F. Muzambinho) e Três Pontas como ponto final. Já em 1930, o tráfego na região era todo da Sul- Mineira, uma vez que o estado de Minas Gerais comprara o ramal em 1928.

A segunda ferrovia a ser construída no sul de Minas foi a E. F. Muzambinho, que, como o nome indica, iniciava suas linhas em Três Corações e atingia Muzambinho, isso em 1892. Na verdade, a E. F. Muzambinho deveria atingir São Joaquim da Serra Negra (município de Alfenas), e foi construída em cima de uma concessão da Minas & Rio, cujos proprietários não demonstraram interesse inicial por esse trecho. O primeiro traçado da Muzambinho foi inaugurado em 1892, partindo de Três Corações, passando por Varginha. Contudo, também teve vida efêmera, pois em 1899 foi encampada pelo governo de Minas e em 1908 foi incorporada à E. F. Minas & Rio.
Esta ferrovia ficou, posteriormente, com a concessão da Minas & Rio, o que aconteceu também com o ramal para as cidades de Cambuquira, Lambari e Campanha.



Minas & Rio


Quando a Estrada de Ferro D. Pedro II alcançou a estação de Lavrinhas, em 1874, o governo da província de Minas Gerais editou a Lei no 2.062, de 4 de outubro, autorizando a construção de uma estrada de ferro que, partindo de Cruzeiro, se dirigisse à confluência dos rios Verde e Sapucaí, dando origem à Estrada de Ferro Rio Verde, com ponto terminal em Três Corações.
Para promover a sua construção, organizou-se em Londres, nesse mes- mo ano, a companhia The Minas and Rio Railway, sendo todo o trecho da estra- da compreendido entre Cruzeiro e Três Corações inaugurado em 14 de junho de 1884; até 1902 foi administrada pelos ingleses, ocasião em que foi passada à União. Prosseguindo, essa estrada de ferro atingiu seu ponto terminal em Juréia (antes chamada de Tuiuti) em 28 de agosto de 1908, onde encontrou os trilhos da Companhia Estrada de Ferro Mogiana.



E. F. Sapucaí


Inauguração da Machadense
A Companhia de Viação Férrea Sapucaí surgiu em 15 de março de 1891, ligando Caxambu a Cristina, com ponto principal na estação de Soledade de Minas, integrante do ramal da Estrada de Ferro Minas & Rio, chegando em 1897 à estação Sapucaí, seu ponto terminal. Soledade passou a ser um centro de um dos maiores entroncamentos ferroviários da região sul de Minas.
A Estrada de Ferro Sapucaí visava, em síntese, a ligação entre a Estrada de Ferro Minas & Rio e a divisa com São Paulo, no município de Ouro Fino, onde se conectaria à Mogiana. A Sapucaí obteve outras concessões de ferrovias que não saíram do papel. Em 1897, a linha da Sapucaí, conforme anteriormente apontado, vinda de Barra Mansa, chegava a Bom Jardim de Minas.

A Sapucaí depois agregou as linhas da E. F. Santa Isabel do Rio Preto, inaugurada em 25 de maio de 1885, ligando esta última à cidade de Barra do Piraí, na então província do Rio de Janeiro. Essa incorporação deu-se em 1889, além da E. F. Santana, quando então atingiu 595 quilômetros de extensão, pas- sando a denominar-se Viação Férrea Sapucaí.
Em 1910, a Viação Férrea Sapucaí incorporou a Estrada de Ferro Minas & Rio e alterou seu nome para Companhia de Estradas de Ferro Federais Brasileiras Rede Sul Mineira.
Nesse mesmo traçado, havia a E. F. Machadense, também de iniciativa privada, com 41 km12 de extensão, com ponto inicial na estação de Alfenas, e também em 1928 comprada pelo governo de Minas.


Rede Mineira de Viação


A Estrada de Ferro Oeste de Minas que era administrada pela União desde 1902 foi arrendada ao estado de Minas Gerais no dia 24 de janeiro de 1931, quando se lavrou contrato estipulando que a Oeste seria explorada técnica e financeiramente em comum com a Estrada de Ferro Paracatu e a Rede de Viação Sul Mineira, sob a denominação de Rede Mineira de Viação, que por sua vez era formada por várias outras ferrovias, tais como a Estrada de Ferro Minas & Rio, a Estrada de Ferro Sapucaí, a Estrada de Ferro Muzambinho e a Estrada de Ferro Machadense.

Uma ferrovia peculiar foi a Estrada de Ferro Paracatu, que apesar do nome, nunca chegou à cidade homônima, onde deveria ser o ponto terminal. Teve pouca projeção histórica e era economicamente inviável. As oficinas fica- vam em Velho da Taipa, onde a estrada se entroncava com a E. F. Oeste de Mi- nas, e ainda um ramal para a cidade de Pitangui. A ferrovia planejava ligar Belo Horizonte a Paracatu; teria o ponto inicial em Azurita (estação da Oeste de Mi- nas a 78 km de Belo Horizonte).
Durante os primeiros anos, a Rede Mineira de Viação ficou dividida em duas estradas de ferro. A Oeste de Minas continuou sendo Estrada de Ferro Oeste de Minas – RMV Oeste, e a Rede Sul Mineira passou a ser denominada Estrada de Ferro Sul de Minas – RMV Sul. Contudo, tudo leva a crer, compulsando-se documentos e fotografias da época, que o sistema foi unificado por volta do início da década de 1940.


Os tempos modernos




Em 1938 as ferrovias Estrada de Ferro Trespontana e Estrada de Ferro Machadense, pertencentes ao estado de Minas Gerais, foram incorporadas à Rede Mineira de Viação. Também em alguns pontos da Muzambinho corriam os trilhos da E. F. São Gonçalo, que foi construída pelo governo de Minas. Era administrada e operada pela Rede Sul-Mineira. Com 30 km de extensão, iniciava-se em Campanha e utilizava o material rodante da Muzambinho.

Em 1951 Juscelino Kubitschek, iniciando seu mandato como governa- dor de Minas Gerais, deu uma conotação mais acentuada à construção de rodovi- as. A base do transporte do estado, até então, era realizada pela Rede Mineira de Viação, que, apesar dos 3.900 km de extensão e dos 3,5 milhões de passageiros transportados em 1952, era altamente deficitária. O governo estadual não tinha interesse em mantê-la, apesar de algumas iniciativas para a modernização da ferrovia. Juscelino, antes mesmo de tomar posse no governo, fechara, em acordo com Getúlio Vargas, a devolução da RMV à União, o que foi concretizado em agosto de 1953.
Depois de passados cinco anos da devolução da RMV à União, seria criada a Rede Ferroviária Federal S. A., já no governo de Juscelino Kubitschek como presidente da República, sendo a mais extensa do sistema ferroviário brasileiro, chegando a 3.882 km.
Em 1965 a Rede Mineira de Viação, juntamente com a E. F. Goiás e com a E. F. Bahia e Minas, transformou-se na Viação Férrea Centro-Oeste e, em 1969, na 5a Divisão Centro-Oeste da RFFSA, posteriormente Superintendência Regional 2 na década de 1970, com sede em Belo Horizonte, mantendo-se como tal até 1996 quando, dentro do programa de desestatização da RFFSA, iniciou-se a concessão da FCA – Ferrovia Centro-Atlântica.


Os caminhos da “Ruim Mais Vai” em Caxambu


Inauguração da Estação de Caxambu, 1926
Nos tempos em que os trens da Rede Mineira de Viação circulavam em grande parte do território mineiro, o logotipo da mesma – RMV – dava margem a brincadeiras, passando a significar “Ruim Mas Vai!” No início os trens que chegaram a Caxambu pertenciam à Viação Férrea Sapucaí e à Estrada de Ferro Minas & Rio. Depois, em 1910, houve a fusão dessas empresas e acabou surgindo a Rede de Viação Sul-Mineira e esta, em 1931, passou a se chamar Rede Mineira de Viação, que operou em Caxambu de 1931 a 1965 e, por fim, a Viação Férrea Centro-Oeste, de 1965 a 1972.

O trem de Caxambu tinha dois destinos: um até Barra do Piraí e outro descia até Cruzeiro, vindo de Baependi. Muita gente reclamava dos atrasos, da limpeza mesmo dos trens; os funcionários da estrada de ferro reclamavam da falta de pagamentos, mas era o que se tinha de melhor como transporte na ocasião, pois a estrada de rodagem asfaltada como hoje conhecemos só surgiria no final dos anos 1950.
Os trens de passageiros da RMV circularam até 1942 entre Barra do Piraí e Passa Três; até 1961 entre Santa Rita de Jacutinga e Barra do Piraí; até 1970 entre Bom Jardim e Santa Rita; até 1972 entre Soledade e Aiuruoca e até 1977 entre Aiuruoca e Bom Jardim.

“Ruim, mas vai”


Último prédio da Estação
As redes ferroviárias que serviram Caxambu foram as seguintes: Viação Férrea Sapucaí (1891 a 1910); Rede Sul Mineira (1910 a 1931); Rede Mineira de Viação (1931 a 1965) e Viação Férrea Centro Oeste (1965 a 1972).

Notas
1. Guia para uma viagem às águas medicinais de Caxambu, província de Minas Gerais, acompanhada de uma breve notícia sobre a povoação e um esboço histórico das mesmas águas.

2. Hoje é a cidade de Itamonte.
3. O antigo Registro do Picu foi deslocado mais tarde para a divisa entre
Minas Gerais e Rio de Janeiro, no local denominado de Garganta do
Registro, onde existiu um posto fiscal.
4. Com a proclamação da República teve a sua denominação mudada para
Estrada de Ferro Central do Brasil.
5. A Estrada de Ferro Rio Verde foi uma concessão dada pelo governo imperial, em 1875, a José Vieira Couto de Magalhães e ao Visconde de Mauá e em maio de 1876 foi aceito o projeto de entroncamento com a Estrada de Ferro D. Pedro II na altura de Cruzeiro, tendo a linha como término a estação de Três Corações. Contudo, logo passou a denominar- se E. F. Minas & Rio, inaugurada em 14 de junho de 1884.
6. Arquivo Público de Minas Gerais. Coleção das leis do império e da república.
7. Idem.
8. Idem.
9. Idem.
10. Húngaro de nascimento, o conselheiro chegou a Sorocaba em 1866 para trabalhar numa fábrica de algodão e em 1871, juntamente com um sócio – Roberto Dias Baptista – fundou a Companhia Estrada de Ferro, mais tarde Estrada de Ferro Sorocabana, do qual seria o primeiro dirigente; foi demitido em assembleia geral do ano de 1880.
11. O conselheiro Mayrink administrou de 1890 a 1904 a Empresa das Águas de Caxambu e foi importante figura no desenvolvimento da cidade que se emancipou em 16 de setembro de 1901, contando, inclusive, com sua influência junto ao governo estadual. Antes, fora administrador da E. F. Sorocabana, tendo substituído o conselheiro Maylask na condução daquela ferrovia, em 1880, a quem acusou de gestão ilegal, malversação de fundos e desfalque.
12. Vejamos interessantes relatos do grande historiador Capistrano de Abreu em cartas ao seu particular amigo João Lúcio de Azevedo, falando como se chegava a Machado antes do trem, em 1920:
 “Hoje parti de Caxambu, amanhã chegarei a Pontalete, na confluência do Verde com o Sapucaí, donde uma linha de automóveis me levará a Machado, à hora de jantar com minha filha. Visita de médico, tal como as do marido, para matar e reviver saudades”. Em outra missiva dizia que: “Pretendo tomar o trem para visitar minha filha no Machado. Viagem bem aborrecida, que se podia fazer num dia, mas toma dois e no segundo ainda exige 50 quilômetros de automóvel agem, ele comenta: "Este (o automóvel) anda cerca de 50 quilômetros, faz-se quase todo no escuro, e o caminho, salvo umas passagens chama- das mata-burro, é regular. O trecho ferroviário é cerca de 10 quilômetros mais que daqui (Rio) a São Paulo, mas pede quarenta horas, por causa de uma interrupção de mais de 20, já na bacia do rio Verde, aonde é forçado a dormir".

Texto publicado na Revista ASBRAP n°21
Agradecimentos
Nossos agradecimentos ao Prof. Paulo Roberto Paranhos pela autorizacao da publicação do texto no Blog da Família Ayres.
Poesia: Eustaquio Gorgonne, Soledade de Minas

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